domingo, 14 de janeiro de 2007




insólito e cativante contador de histórias

No 8º ano de escolaridade, um dos textos sugeridos pelos programas para leitura nas aulas de Língua Portuguesa é o conto A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho de Mário de Carvalho.
É daqueles textos que muitas vezes se evita nas Planificações por ser, de acordo com uma opinião generalizada, difícil de perceber por parte dos alunos…

Não será talvez bem assim… Aliás, há quem, mesmo não fazendo parte da Planificação do Grupo Disciplinar, leia o texto (recreativamente) aos alunos, tendo resultados bastante agradáveis.

A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho é daqueles textos que prende a atenção e motiva para leitura. Sente-se que houve uma grande vontade de contar. E esse é, afinal, o segredo da arte de contar.

“Mas o que é afinal a arte de contar? É uma vontade de contar. Não tanto da parte do público que deseja ler histórias, mas da parte do autor que tem vontade de contar essas histórias, de contar o que quiser e como quiser. E assim o impulso ficcional volta ao início, mas transformado pelos debates e mudanças no género romanesco. Sem esquecer evidentemente outras formas de ficção como conto, porque o conto é a forma privilegiada de contar histórias.” Desta maneira nos fala Pedro Mexia a propósito de Mário de Carvalho e da sua obra. E diz-nos ainda que este autor é um dos “que mais exemplarmente tem representado essa vontade de narrar.”

Só a título de exemplo, para aqueles que ainda não lerem Mário de Carvalho, aqui fica o início do conto A Inaudita Guerra da Avenida Gago Coutinho:

O grande Homero às vezes dormitava, garante Horácio. Outros poetas dão-se a uma sesta, de vez em quando, com prejuízo da toada e da eloquência do discurso. Mas, infelizmente, não são apenas os poetas que se deixam dormitar. Os deuses também.

Este parágrafo, bem lido(!), transporta, quase em simultâneo, os leitores para o mundo da ficção, onde o passado se vai misturar com o presente, criando nos jovens leitores, principalmente, grande expectativa.
Aliás este recurso é muito utilizado por Mário de Carvalho. Muitas das suas obras recuam bastante no tempo histórico. Facto que o autor justifica da seguinte forma:
Quatro mil, cinco mil anos de história (que se conta a partir dos primeiros registos escritos) é um período muito curto da humanidade. O homem contemporâneo, o medieval ou o romano são o mesmo homem. Ainda não se inventou aquilo que se chamava o «homem novo» (ou a invenção deu mau resultado). As pessoas ficam muito admiradas quando eu desconfio das utopias. Mas nas coisas do mundo real sou muito prático e muito concreto. Tal como na política. No mundo da ficção, aí sim, cabem todas as utopias e todos os delírios.”
Este homem, a quem Urbano Tavares apelidou de “insólito e cativante contador de histórias”, é responsável por uma obra variada quer em temas, géneros ou tempos históricos. O seu registo é frequentemente irónico, mesmo humorístico, com várias incursões pelo domínio do fantástico. Além de romancista, contista e dramaturgo é ainda autor de diversos guiões, diálogos e adaptações para televisão e de um guião para cinema. São mais de vinte anos de carreira literária, com registo de, pelo menos sete prémios, onde apenas falta a expressão lírica. Mas também esse dado não é fruto do acaso… “Um autor, de quem me não recordo o nome agora, dizia não fazer poesia porque «não gostava de falar de si». Eu não me atrevo a escrever poesia; é uma coisa tão elevada e distante. A minha área é a da narrativa e das histórias.

Que mais se pode dizer neste espaço sobre este perfil, afinal tão simples e humano? Acrescentar, talvez, alguns dados biográficos.
Mário de Carvalho nasceu em Lisboa, a 25 de Setembro de 1944. É nesta cidade que tem vivido e foi nela que tirou o curso (Direito). Exerceu advocacia e mais recentemente deu aulas de “escrita de argumento” na Escola Superior de Teatro e Cinema.
E é com palavras suas a propósito dos workshops de “escrita criativa que terminamos a referência literária de hoje:
É como o «Melhoral» [os workshops de “escrita criativa], não faz bem nem faz mal…Tudo o que sirva para interessar as pessoas pela leitura, seja bem-vindo.”

2 comentários:

Cristina disse...

e é uma excelente conclusão!

beijocas

Rosalina Simão Nunes disse...

é gira a comparação, não é?

beijoca