sábado, 18 de fevereiro de 2012

Alma de jornalista

Diz Manuel António Pina, numa entrevista ao i: "Uma coisa que eu aprendi no jornalismo é a humildade. Se conhece escritores, sabe que normalmente são tipos que acham que é fundamental aquilo que escrevem. No caso do jornalismo, como sabemos que aquilo que escrevemos no dia seguinte está a embrulhar o peixe, não é assim. No jornalismo aprendi essa humildade fundamental. Tenho de escrever, nas minhas crónicas, 1400 caracteres, o morto à medida do caixão – agora tenho-lhes metido o IVA, como aumentou, escrevo 1420. E meti-lhe o IVA baixo. Depois de escrevermos uma coisa, o coordenador corta e altera o título. O jornalismo é um trabalho colectivo. Isso dá-nos uma grande modéstia. O Luiz Pacheco dizia que daqui a cem anos ninguém se lembra. Qual daqui a cem anos... Mesmo na altura já ninguém se lembra. Os escritores têm muita dificuldade em aceitar que tudo acaba por se esquecer. Tudo tende para o esquecimento. Mas há mais relações, o jornalista aprende com o escritor o respeito pelas palavras, sabendo que há palavras que se dão com as outras, e outras não. Não calcula o tempo que demoro a escrever aquela merda com 1400 caracteres. Leio aquilo tantas vezes... Volto atrás e vou para a frente. Só a trabalheira de arranjar assunto. Eu espontaneamente só tenho opinião uma vez por ano, agora tenho de ter todos os dias porque ganho a vida assim. Nunca leio o que escrevi no dia seguinte, porque se o faço fico completamente frustrado." 

Destaquei este excerto, pela importância que todos os dias dou à escrita, mas toda a entrevista deve ser lida. Vale a pena a lucidez. E a história contada a propósito de Sampaio é deliciosa! Claro que eu nunca daria àquela entrevista o título que lhe deu o jornalista. Mas eu não sou jornalista.

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