Alexandre O’Neill – um fazedor de palavras
Hoje, Alexandre O’Neill.
De acodo com António Alçada Baptista (in A pesca à Linha – Algumas Memórias) esta figura da nossa literatura foi um poeta que procurou mergulhar numa certa forma de realismo poético e a sua experiência surrealista teve muito mais a ver com a necessidade de desembaraçar a liberdade das suas entranhas repressões do que como o processo de libertação aotomática da palavra, que exprimisse qualquer conteúdo poético oculto. (...) nenhum poeta contemporâneo foi como ele capaz de captar com mais subtileza o halo poético do quotidiano, o estopo lírico-épico-dramático que está por debaixo da banalidade dos dias.
Hoje, Alexandre O’Neill.
De acodo com António Alçada Baptista (in A pesca à Linha – Algumas Memórias) esta figura da nossa literatura foi um poeta que procurou mergulhar numa certa forma de realismo poético e a sua experiência surrealista teve muito mais a ver com a necessidade de desembaraçar a liberdade das suas entranhas repressões do que como o processo de libertação aotomática da palavra, que exprimisse qualquer conteúdo poético oculto. (...) nenhum poeta contemporâneo foi como ele capaz de captar com mais subtileza o halo poético do quotidiano, o estopo lírico-épico-dramático que está por debaixo da banalidade dos dias.
Estas últimas palavras de Alçada Baptista fazem-nos pensar no “Divertimento com sinais ortográficos”:
“? –Serás capaz / de responder a tudo o que pergunto?”;
“, - Quando estou mal disposta / (e estou-o muitas vezes...) / mudo o sentido às frases, / complico tudo...”;
“ç – uma vírgula rebaixada / á condição de cedilha”;
“! – Não abuses de mim!”
Nascido a 19 de Dezembro de 1924, em Lisboa, entra em 1932 para a Escola Primária da Rua S. José dos Carpinteiros. Um ano depois passa para o ensino particular, ingressando no Colégio Português de Educação Feminina, onde terminará a instrução primária e iniciará o curso dos liceus.
1944 é um ano de viragem na sua vida, determinante para o seu futuro profissional. Já terminado o liceu não é admitido para o Serviço Militar devido à asma e à miopia. Vê também negada a frequência do Curso de Pilotagem da Escola Náutica de Lisboa por causa da miopia. Como alternativa a estes dois projectos gorados, volta ao liceu para fazer, como externo, o Curso Complementar de Letras.
Em 1947 publica, na revista Mundo Literário, os seus primeiros textos. Em 1948 participa da fundação do Grupo Surrealista de Lisboa.
A relação de O’Neill com o grupo Surrealista dura pouco. Em 1950 abandona o grupo, no entanto ele não era avesso aos ideiais básicos do Surrealismo.
Passa, então, a colaborar com Cadernos de Poesia. No ano de 1951 publica a obra Tempo de Fantasmas – o seu primeiro livro de poemas.
Passa, então, a colaborar com Cadernos de Poesia. No ano de 1951 publica a obra Tempo de Fantasmas – o seu primeiro livro de poemas.
Em 1953 é preso pela PIDE durante 40 dias, sendo visitado semanalmente pela irmã, que o faz à revelia dos pais. Mas é a mãe que acabará por mover influências, contra a vontade do filho, para que ele seja posto em liberdade.
O’Neill esteve sempre do outro lado do regime político imposto por Salazar, escrevendo panfletos e colaborando em diversas actividades anti-ditatoriais. Também nos seus versos o salazarismo aparece retratado:”(...à roda sem que apodreço / apodrecemos / a esta para ensanguentada que vacila / quase medita / e avança mugindo pelo túnel / de uma velha dor.”
Tal como muitos outros homens da literatura, a sobrevivência económica de O’Neill não provinha dos seus poemas. Foi a publicidade que lhe deu algum conforto económico tendo sido o criador de solgans como: “Bosch é Bom” e “Há mar e mar, há ir e voltar.”
Casou duas vezes, tendo de cada uma das uniões um filho, e manteve outra relação de 1980 até ao ano da sua morte em 1986.
Alexandre O’Neill “trabalhava os seus versos até chegar à simplicidade evidente de parecer que não dá trabalho nenhum” (Alçada Baptista). Exemplo dessa arte de fazer as palavras é sem dúvida o poema “Amigo”, presente em muitos dos manuais de Língua Portuguesa dos nossos poemas e que aqui deixamos para uma reflexão:
Alexandre O’Neill “trabalhava os seus versos até chegar à simplicidade evidente de parecer que não dá trabalho nenhum” (Alçada Baptista). Exemplo dessa arte de fazer as palavras é sem dúvida o poema “Amigo”, presente em muitos dos manuais de Língua Portuguesa dos nossos poemas e que aqui deixamos para uma reflexão:
Mal nos conhecemos
Inaugurámos a palavras
«amigo».
«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar limpo,
Uma casa, mesmo modesta,
que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
«Amigo» (recordam-se, vocês
aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de
inimigo!
«Amigo» é o erro corrigido,
Não o erro perseguido,
Explorado,
É a verdade partilhada,
praticada.
«Amigo» é a solidão derrotada!
«Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma
grande festa!
Inaugurámos a palavras
«amigo».
«Amigo» é um sorriso
De boca em boca,
Um olhar limpo,
Uma casa, mesmo modesta,
que se oferece,
Um coração pronto a pulsar
Na nossa mão!
«Amigo» (recordam-se, vocês
aí,
Escrupulosos detritos?)
«Amigo» é o contrário de
inimigo!
«Amigo» é o erro corrigido,
Não o erro perseguido,
Explorado,
É a verdade partilhada,
praticada.
«Amigo» é a solidão derrotada!
«Amigo» é uma grande tarefa,
Um trabalho sem fim,
Um espaço útil, um tempo fértil,
«Amigo» vai ser, é já uma
grande festa!
2 comentários:
O'Neil foi (e ainda é) um grande poeta.
Boa semana.
Beijos.
é, nilson, como quase todos os bons poetas: intemporais.
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