Tenho um hábito terrível...Gosto de conversar com as palavras escritas dos outros.
Calmamente, sem ter de esperar pela resposta, uma vez que na comunicação escrita ela nunca é imediata. Gosto de digerir os textos dos outros, se quiserem...
E hoje apeteceu-me conversar com o editorial de João Morgado Fernandes do DN online .
Finda a primeira leitura, fiquei com a nítida sensação que alguém tinha descoberto algo de novo. E mais, que essa descoberta seria crucial para a minha vida!!!
Portanto, tive de reler.
De facto, manteve-se essa sensação de descoberta, mas, numa segunda leitura, ficou-me, também, um sorriso simpático, quase condescendente, nos lábios: alguém tinha chegado a uma conclusão. E alguém sentira que estava a perder o poder.
Alerta-nos, então, João Morgado Fernandes para aquilo que designa como "um dos equívocos mais perigosos dos tempos que correm", a saber, a associação implícita da "web 2.0 e a democracia, ou melhor, o aperfeiçoamento da democracia".
Aqui, permitam-me, uma dúvida quase existencial: Que quererá dizer o autor com "o aperfeiçoamento da democracia"?!...
Depois, dum poderosíssimo nós, em que todos somos controladores da Era da Informação, passa, logo de seguida, a ser usada uma terceira pessoa muito impessoal, excessivamente. Isto é, enquanto se fala no controlo da informação, os jornalistas, fazem parte do grupo. Serão, aliás, eles, talvez..., que até agora tenham controlado a informação ao sabor dos sucessivos poderes políticos. Mas, quando o novo fenómeno inquietante ganha relevo, então, já não se usa a palavra 'controlador', mas sim 'utilizador', sendo que o nós de controlador passa, sub-repticiamente, a um eles/ele de utilizador(es).
A frase "Mas a actual febre participativa só parcialmente pode ser confundida com democracia." está imbuída dum autoritarismo gritante!
Claro que o início das coisas é sempre apaixonante e as pessoas, quando envolvidas, se sentem entusiasmadas e cometem, frequentemente, excessos. Contudo, afirmar que participar, mesmo que seja com febre..., não é viver em democracia, é, no mínimo, abusivo.
As democracias nascem com a participação dos cidadãos, das pessoas.
Mantendo a tal 3º pessoa impessoal, numa escrita distante, quase fria, no quarto parágrafo, ficamos a saber que a web 2.0 é "um espelho dos desequilíbrios existentes". Portanto, os seus utilizadores serão, poderemos concluir, uns desequilibrados (nós).
Ora, esta acusação, ainda que velada, é grave.
Ora, esta acusação, ainda que velada, é grave.
De seguida, discursa-se sobre o poder político na Net. Tentando explicar-se, quanto a mim, de forma muito primária, que quem detém o poder fora da Net é quem detém o poder na NEt. Isto é, também na net, haverá os pobres e os ricos. Os que mandam e os que obedecem.
Tenho as minhas dúvidas, sobre essa leitura tão linear...
O 5º parágrafo inicia com uma frase que cito na íntegra, dada a sua requintada construção sintáctica e vocabular: "Outra debilidade da Net enquanto instrumento de participação cívica tem a ver com a extraordinária disseminação, espacial e não só, dos seus agentes, o que a transforma numa interessante babel, mas igualmente num inoperante e até perigoso monstro." Fica-se com a impressão de que a net é, afinal, um vírus que se dissemina a uma velocidade contagiante, sem permitir a descoberta do antídoto. Explora-se aqui a questão da falta de civismo. Bem, talvez aqui fosse oportuno usar a tal imagem da net como um "espelho" do mundo real e tudo seria mais fácil de explicar.
De novo, no penúltimo parágrafo, se faz uso de linguagem abusiva. O que não abona nada a favor do autor do texto, quando precisamente no parágrafo anterior alerta para o desrespeito das "regras de conduta". A net "do ponto de vista meramente quantitativo" é, e continuo a citar, " um amontoado de lixo". Sendo que aquilo que aqui estou a fazer, neste momento, "não quer dizer que tenha, necessariamente, algo de útil a dizer à comunidade".
Fazendo minhas as palavras de João Morgado Fernandes , direi, creio que, neste caso, pertinentemente: "Digamos que o mundo virtual ainda não encontrou o seu paradigma civilizacional."
Por último, faz-se referência ao potencial da Net, sublinhando-se, contudo, a necessidade de estabelecer limites. E, diabolicamente, direi eu..., usa-se, novamente, a primeira pessoa do plural, como se fosse à imprensa que coubesse a função de estabelecer as regras, os limites.
Graças a Deus que eu e outros como eu temos consciência deste "poderosíssimo instrumento ao nosso dispor" e que estamos conscientes dos seus limites.
2 comentários:
Uma chapelada para ti. Subscrevo totalmente a tua análise.
Um bom final de Ano e um 2007 repleto do que desejares.
dá-me para isto, às vezes, claudynius. ;)
excelentes entradas.
obrigada.
Enviar um comentário