sexta-feira, 11 de maio de 2007



pedras frias
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e começou a andar. ouvia-se apenas o martelar dos saltos na pedra. sintonizados, crescentes.
de repente parou. alguém, apressado, vinha atrás dela. ficou assim, petrificada, muda, como o frio que vinha da pedra. sabia que tinha de sair dali, que alguém a queria prender, mas as pernas não obedeciam e ali estava.
e os outros, os que vinham atrás, cada vez estavam mais perto...já eram as vozes deles que ouvia quase ali. as lágrimas começaram a cair. quantas saudades lhe surgiram de repente. memórias dos outros tempos em que, criança, por ali corria e ouvia as gargalhadas dos vizinhos, dos amigos, da mãe. a mãe...quanta ternura! o murmúrio de todos os dias; as palavras das pessoas que passavam; as mãos dos namorados que se entrelaçavam; os beijos que ali tinham roubados.agora, uma praça vazia.agora, pedras que eram apenas frias...
agora, vozes que vinham do medo. tudo estava ali. e eles, os outros, quase a gritarem-lhe aos ouvidos para parar. mas ela já estava parada, ela não conseguia andar, ela estava petrificada, ela, afinal, não queria ir. e levantou um braço. agitou os dedos, lançou o corpo para a frente. movimentou-se languidamente. um tiro. caiu. as pedras frias da praça receberam o corpo e os olhos, agora fixos no cinzento da pedra, sorriam serenamente.
1.maio.06

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